terça-feira, 12 de março de 2019

Projeto de Lei criminaliza perseguição que fez radialista fugir de MS


A radialista Verlinda Robles se viu obrigada a fugir de Mato Grosso do Sul após dois anos de perseguição. O que parecia carinho de fã se transformou em pesadelo. O ápice do crime, ainda não reconhecido no Brasil, foi o suspeito alterar faturas da vítima, encaminhando para seu próprio endereço. Um Projeto de Lei do deputado federal Fábio Trad (PSD-MS) criminaliza esse tipo de violência, conhecida como Stalking (perseguição), e prevê pena de reclusão em regime fechado.

Foram dois anos de ligações, presentes e quantias em dinheiro devolvidas de forma imediata, para que a radialista entendesse a gravidade da situação. As declarações bizarras do autor sempre envolviam um chamado divino em que Verlinda seria a “enviada por Deus” para ser sua mulher.
“Eu sou locutora há quase 30 anos você sempre recebe carinho dos ouvintes e, em princípio, pensei que fosse, já que ele também se intitulava como ouvinte. Até que ele começou a dizer que estava apaixonado e dizer que foi Deus que me colocou na vida dele e que eu era a escolhida. Ele usava esse termo e toda vez que ele ligava”, conta.
As investidas tomaram grandes proporções e o stalking começou a incomodar todos que viviam ao redor da vítima. Verlinda conta que mesmo se tratando de uma pessoa cega passou a sentir medo, porque ele era debochado e irônico nas ligações.
Ação semelhante acontece na série norte-americado "You", em que durante a perseguição, os amigos e familiares da vítima também se tornam alvos.
“Eu sou paulista e cheguei a ouvir em diversas ligações que ele tinha me visto em uma praça de Birigui, em 1992, quando ele ainda enxergava. Ele dizia que eu não o amava agora, mas que ainda iria amá-lo. O negócio foi ficando sério e ele foi conseguindo celulares particulares de amigos. Chegou uma hora que eu não estava mais aguentando. Até o pessoal do ambiente de trabalho começou a reclamar dizendo que teria de dar um jeito e parar tudo isso”, frisa.
A fuga -Verlinda trabalha com o rádio há 30 anos. Ela conta que foi radialista em Costa Rica de 2002 a 2010. Logo depois, se mudou para Chapadão do Sul, onde trabalhou até 2016.
Tudo começou quando a radialista voltou à Costa Rica, onde trabalhou até 2018. Neste intervalo, Verlinda passou três meses na Inglaterra e, para provar a dimensão dos atos, nem em outro continente teve paz.
“Depois que voltei para Costa Rica viajei para a Inglaterra e fiquei três meses, em 2018. Nem lá tive paz. Ele descobriu meu telefone e me ligava, tentava ligar, né, porque estava bloqueado”, disse.
Pouco depois do primeiro boletim de ocorrência, Verlinda deixou a rádio em Costa Rica e se mudou para Nova Andradina. Mesmo em outra cidade bastaram alguns dias para que ele descobrisse onde ela estava trabalhando.
Cansada de fugir, a radialista tentou colocar um ponto final e voltou para São Paulo, onde aguarda o andamento do processo desempregada. A radialista volta a Nova Andradina no dia 20 de março, para a primeira audiência do caso.
“Tive que vir embora. Ele chegou a falar para conhecidos que mesmo após depor na Polícia Civil, não iria dar em nada. Ele disse que deixaria de me perseguir por um tempo, mas depois voltaria”, revela.
“Eu estava em Nova Andradina e meu celular estragou. Como minha conta estava atrasada eu busquei no e-mail, mas não achei a fatura. Uma amiga me ajudou a procurar e no site da operadora descobrimos que a fatura do mês de janeiro estava paga. Na hora levei um susto, mas como nos últimos dois anos, eu já estava sofrendo a perseguição ele foi a primeira pessoa que ele lembrei. Ele tinha trocado o endereço da fatura para a casa dele, entrei em desespero e comecei a chorar”, disse.
O segundo boletim de ocorrência foi registrado em fevereiro, quando Verlinda tentou uma medida protetiva, mas descobriu que por não ter vínculo com o autor, a medida teria de ser solicitada na Justiça.
Porém, Verlinda conta que o trâmite legal foi rápido e a medida concedida 15 dias. A decisão determinou distância de pelo menos 200 metros da vítima e proibiu o contato por telefone ou correspondência.
Mesmo com vários números bloqueados, Verlinda recebia a notificações das tentativas de chamadas do autor. No entanto, a última tentativa de ligação feita por ele ocorreu no dia 15 fevereiro.
Por que não trocar o número? A radialista não aceitava ter de mudar toda a sua rotina, inclusive o número do celular para fugir do autor. Para ela, a sensação era de que ele estaria perdendo e ele ganhando. “Sempre me pediam para trocar meu número e eu não aceitava ter que mudar por conta da perseguição. Por que eu? Ele estaria ganhando”, disse.
Apoio - Hoje, Verlinda enxerga que teria de ter agido antes. Mas por vergonha da situação procrastinou a divulgação. “Depois que levei a público e postei meu sofrimento no Facebook recebi força. Se eu soubesse que ia teria apoio eu teria feito mais cedo às vezes o que falta é apoio”, disse.
Projeto de Lei – Verlinda é vítima de um crime que ainda não é reconhecido no Brasil, no entanto, está a um passo de ser legalizado. O deputado Fábio Trad (PSD) apresentou no dia 21 de fevereiro, o projeto de lei 1020/2019, que criminaliza o stalking – perseguição.
Ao Campo Grande News, o deputado disse que se baseou num estudo do Fonavid (Fórum Nacional de Juízas e Juízes de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher), que comprova o aumento no número de casos de perseguição no Brasil, principalmente com o avanço das redes sociais.
O parlamentar lembrou-se da importante colaboração da pesquisadora e Promotora de Justiça, Ana Lara Camargo de Castro, autora do livro “Stalking e Cyberstalking: obsessão, Internet, Amedrontamento”.
“Chegamos a conclusão que hoje não nada há nada que penalize de alguma forma alguém que pratique esse tipo de ação. Apresentei o projeto há algumas semanas e foi encaminhado às comissões. Diante da expansão do assunto liguei para o presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia que reconheceu a necessidade de aprovação com urgência e se comprometeu em acelerar a tramitação”, disse.
Para Fábio Trad, a falta de previsão legal, indiretamente, estimula a perseguição. “A mensagem que o parlamento enviará a sociedade é de a ação será criminalizada com penas que geram prisão em regime fechados”, disse.
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