Lionel Messi enfim descansa. Depois de conquistar a tão sonhada Copa do Mundo pela Argentina, a lenda do futebol está em Rosário, cidade onde nasceu, passando o Natal com sua família.
A necessária reclusão depois da insana festa vivida em Buenos Aires na terça-feira (20) não impediu que o campeão mundial chorasse e entrasse em contato com uma rádio argentina para agradecer o carinho expressado pelo escritor Hernán Casciari.
Um dos mais conhecidos autores argentinos a unir o futebol e as letras, Casciari já produziu inteligentes textos ligando o futebol aos animais e às infâncias de cada um dos apaixonados pelo esporte.
O escritor participa do programa de rádio "Perros de la calle" ("Cachorros de rua"), da Urbana Play, com o famoso jornalista argentino Andy Kusnetzoff. Na última quinta-feira (22), ambos leram um conto de 9 minutos chamado "La valija de Lionel" ("A mala de Lionel").
Para surpresa de ambos, Messi entrou em contato com a produção do programa dizendo que havia chorado com o conto.
"Queria dizer que levantei com Anto [Antonela, mulher de Messi], estávamos tomando mate, e o que Hernán fez foi impressionante", contou o camisa 10. "Começamos a chorar nós dois porque é algo muito certo o que ele conta. Queria agradecê-los e dizer que escutamos e nos emocionamos. Queria que soubessem. Mando um abraço grande a todos, e obrigado mais uma vez.".
A mala de Lionel
Casciari viveu 15 anos na Espanha, e acompanhou a carreira de Messi desde quando ele estava nas categorias de base do Barcelona.
"A mala de Lionel", título que ele usa para narrar o percurso do astro através de um conto, narra o dilema daqueles que saem da Argentina rumo à Europa.
"Havia duas classes de imigrantes: os que guardavam a mala no guarda-roupa e nem bem chegavam à Espanha e diziam 'vale', 'tío' e 'hostias' [gírias espanholas]. E aqueles que não guardavam a mala e mantinham os costumes como por exemplo o mate ou o 'yeísmo' [forma de falar que se assimila ao espanhol falado na Argentina]. Dizíamos 'yuvia', dizíamos 'caye' [chuva ou rua, em português]", contava um trecho.
Casciari é editor da revista Orsai e vai publicar o conto na íntegra na edição de fevereiro. Ele também chorou com a reação de Messi: "Foi tremendo. Se quando eu era criança me pediam para escolher ganhar o prêmio Nobel ou Cervantes, ou emocionar Messi com um conto, escolho o que aconteceu hoje"
Outros trechos do conto:
"Tanto para ele como para a gente, os imigrantes, sabíamos que o acento [semelhante ao sotaque argentino] era o mais difícil de manter. E Messi foi o nosso líder nessa batalha. Aquele menino que não falava, mantinha vivo em nós a forma de falar."
"De repente, não só aproveitávamos o melhor jogador que havíamos visto, mas também vigiávamos para que não escapasse nenhum modismo espanhol, em nenhuma entrevista."
"É difícil explicar o quanto ele alegrou a vida daqueles que viviam longe de casa. O quanto ele nos tirou da monotonia da sociedade e nos justificou. Messi nos fez felizes de uma forma tão serena, tão natural, e tão nossa, que quando começaram a chegar os insultos vindos da Argentina, não conseguíamos entender."
"Vivi 15 anos longe da Argentina, e não me ocorre pesadelo mais espantoso do que escutar vozes de desprezo que chegam do lugar que a pessoa mais gosta no mundo."
O conto descreve o alívio que os fãs argentinos que viviam na Catalunha sentiram quando ele abandonou a seleção em 2016, para voltar poucas semanas depois. Neste período de isolamento, Messi recebeu uma mensagem no Facebook de Enzo Fernández, eleito o melhor jogador jovem do Mundial do Qatar.
Casciari segue:
"Messi voltou à seleção para que esses garotos que lhe mandavam cartas não acreditassem que desistir era uma opção de vida. "Ao voltar, ganhou tudo o que faltava e calou a boca dos seus detratores."
"Nos alegra confirmar que ele segue sendo o mesmo que quando nos ajudou a ser felizes quando estávamos longe."
"Por isso a humanidade inteira desejava o triunfo de Lionel com tanta força. Nunca ninguém havia visto, no topo do mundo, um homem simples."
"Como em todos os anos, Messi voltou para passar o Natal com sua família em Rosário, para cumprimentar seus vizinhos. Seus costumes não mudam."
"O único que muda é o que ele nos trouxe em sua mala."
FONTE: UOL