Sabe quando você liga o rádio e começa a imaginar o rosto dos locutores, o cenário de uma notícia ou a atmosfera de um estádio de futebol? Essas imagens que até hoje estavam apenas na sua cabeça vão ganhar vida quando a Águia de Ouro passar pelo Sambódromo do Anhembi no carnaval de 2024: “Eu pensei: é um grande show. É um grande espetáculo, como se fosse um abrir de cortinas. A pegada é essa. A informação entra na sua cabeça e seu cérebro codifica aquilo para criar uma imagem”, explica o carnavalesco Victor Santos quando perguntado sobre o desafio de criar uma identidade estética para um veículo baseado no áudio. Ele aposta no “inconsciente coletivo” para criar fantasias e alegorias de fácil identificação.
O enredo “Águia de Ouro nas ondas do rádio” narra a história deste veículo no Brasil. O abre-alas traz à frente um laboratório científico onde são descobertas as ondas eletromagnéticas que levam a nossa voz até os seus ouvidos; na parte traseira, surge o Theatro Municipal do Rio de Janeiro onde, no dia 7 de setembro de 1922, foi feita a primeira transmissão radiofônica do Brasil. A primeira ala após esta alegoria fala sobre as pessoas que não sabiam ler e que a partir desta inovação também puderam ter acesso às notícias: “Foi a inclusão imediata. Só tinha acesso à notícia quem podia ler porque as notícias eram veiculadas pela imprensa escrita. E mais de 70% da população brasileira da época era analfabeta”, explica Victor Santos.
O enredo, então, começa em 1922. Mas o carnavalesco resolveu abrir um parêntese nessa história na hora de desenvolver a fantasia da bateria. Os ritmistas da Batucada da Pompeia vão homenagear o padre gaúcho Roberto Landell de Moura, que já no fim do século XIX, três décadas antes da primeira transmissão no país, já tinha descoberto a possibilidade de transmitir a voz pelas ondas eletromagnéticas: “Ele fez uma transmissão aqui em São Paulo e foi acusado de bruxaria. Ele foi demonizado, foi perseguido, teve o laboratório quebrado, teve que mudar de paróquia... Diziam que ele tinha uma ‘caixa mágica’. Ele fez a experiência e aquilo gerou muito problema pra vida dele”, narra Victor. O carnavalesco quer reparar o que considera um “erro histórico” do Brasil, que não só não valorizou como ainda atrapalhou as invenções de Landell: “Quantas coisas mais ele poderia ter inventado se tivesse tido apoio? É o carnaval revelando mais uma personagem”, orgulha-se.
A Águia de Ouro quer mostrar também como o rádio está presente na vida do brasileiro com prestação de serviço, música, informação, esporte, entretenimento, companhia para os mais solitários, dentre outras atrações: “O nosso samba é alegre. É a cara do rádio, que é uma peça muito importante nas nossas vidas e trouxe tanta coisa boa para o Brasil”, garante o intérprete Douglinhas Aguiar.
A era de ouro que consagrou reis e rainhas do rádio na década de 1940 será retratada em uma alegoria e também nos figurinos da escola da Pompeia, zona oeste de São Paulo: “A parte de costura foi muito importante porque a gente quer retratar uma época de muita elegância, de muito vestido, de muito paletó... A gente quer que as pessoas olhem e se lembrem dessa época”, conta Victor Santos. Ainda em uma onda mais saudosista, ele traz a lembrança de alguns hábitos que uniram o Brasil em torno do rádio como escutar “A Voz do Brasil” ou rezar a Ave Maria: “Todas as pessoas se reuniam às 18 horas pra um momento de oração. É a hora que marca o momento em que o anjo Gabriel anunciou para Maria de Nazaré que ela seria mãe de Jesus. Ficou marcado pelo rádio o momento da Ave Maria. As pessoas colocavam um copo em cima do aparelho pra que ele fosse energizado com a oração. Isso unia o Brasil inteiro”, afirma. A alegoria sobre esse momento é uma das grandes apostas da Águia de Ouro para o desfile.
A reta final do enredo fala sobre o veículo na atualidade. Destaca o uso da comunicação via rádio em serviços como o SAMU e o Corpo de Bombeiros e fala também sobre a era multiplataforma em que os ouvintes acessam programas e emissoras pela internet. Aqui surge o grande homenageado do desfile: Eli Corrêa, radialista com mais de 50 anos de trajetória no rádio de São Paulo. A escola traz no refrão do samba-enredo o bordão “ooooooooooooooi, gente!” que marcou a carreira do “homem sorriso do rádio”: “A Águia de Ouro é uma escola irreverente. Ao longo do desfile todo mundo vai cair no samba. O refrão é muito fácil, o ‘oi, gente’ é marcante e eu tenho certeza que o Anhembi vai vir junto com a gente”, aposta o intérprete Douglinhas Aguiar.
A Águia de Ouro será a quinta escola a desfilar no sábado de carnaval.
FONTE: CBN